18 fevereiro, 2015

Ação das empresas junto a ministro é 'intolerável', diz juiz da Lava Jato

O juiz federal Sérgio Moro, da Operação Lava Jato, afirmou em decisão desta quarta-feira (18) que é "intolerável" a iniciativa de advogados de empreiteiras de se reunirem com o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo para "obter interferência política" e endossou as críticas feitas pelo ex-presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Joaquim Barbosa ao episódio. 

A argumentação foi feita por Moro para justificar uma nova ordem de prisão preventiva contra os empreiteiros Ricardo Pessoa (UTC), Eduardo Hermelino Leite (Camargo Corrêa), Dalton Avancini (Camargo Corrêa) e João Auler (Camargo Corrêa), sob o entendimento de que as empreiteiras têm tentado interferir nas investigações. 

Cardozo teve reuniões com advogados da UTC, da Camargo Corrêa e da Odebrecht nos últimos meses, empreiteiras alvo das investigações da Lava Jato. O fato foi criticado por Joaquim Barbosa, que pediu a demissão do ministro. Formalmente, a Polícia Federal, que conduz as investigações da Lava Jato, é subordinada ao ministro. 


Ricardo Borges - 4.dez.2014/Folhapress
O juiz federal Sergio Moro, que conduz os processos da Operação Lava Jato
O juiz federal Sergio Moro, que conduz os processos da Operação Lava Jato

Moro citou as notícias sobre os encontros de Cardozo para também fazer críticas ao episódio. Afirmou que a prisão dos executivos deve ser discutida "nos autos" e que não há qualquer empecilho para que ele mesmo receba os advogados constituídos, o que, segundo o juiz, ele faz "quase cotidianamente". 

"Intolerável, porém, que emissários dos dirigentes presos e das empreiteiras pretendam discutir o processo judicial e as decisões judiciais com autoridades políticas", afirmou o juiz. E continuou: "Mais estranho ainda é que participem desse encontros, a fiar-se nas notícias, políticos e advogados sem procuração nos autos das ações penais". 

Moro ressaltou ainda que Cardozo não é responsável pelas investigações, não fazendo diferença reunir-se com ele. "Não socorre os acusados e as empreiteiras o fato da autoridade política em questão ser o ministro da Justiça. Apesar da Polícia Federal, órgão responsável pela investigação, estar vinculada ao ministério, o ministro da Justiça não é o responsável pelas ações de investigações".

O juiz classificou o episódio de "indevida, embora mal sucedida, tentativa dos acusados e das empreiteiras de obter uma interferência política" e afirmou que Barbosa "bem definiu a questão" ao dizer que, se você é advogado em um processo, deve recorrer ao juiz, "nunca a políticos". 

Moro, porém, evitou criticar diretamente Cardozo, afirmando que não há prova de que ele tenha se disposto a atender às solicitações das empreiteiras. "Sequer é crível que se dispusesse a interferir indevidamente no processo judicial e na regular e imparcial aplicação da Justiça", escreveu o juiz da Lava Jato. 

OUTRO LADO
 
Advogado da Camargo Corrêa, Celso Sanchez Vilardi afirmou que não se reuniu com o ministro Cardozo, embora sustente que não vê nenhum problema em encontros dessa natureza. 

"A discussão não tem o menor cabimento, e tenho a impressão de que estão confundindo as pessoas dos acusados com as dos advogados", criticou Vilardi. 

Advogado Alberto Toron, que representa a UTC, afirma que nunca se reuniu com Cardozo para tratar da Operação Lava Jato, mas, sim, com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. 

Toron classificou o despacho de Moro como truculento. 

"Decisão do juiz Moro peca não apenas pela presunção como pela truculência. Em primeiro lugar, é direito dos advogados conversar com quem quiserem, inclusive com o ministro da Justiça. Este, por outro lado, não pode interferir no processo, que tem estrutura própria e é controlado e dirigido pelo poder Judiciário", argumentou Toron. 

O advogado da UTC disse ainda que "causou profunda estranheza a referência a 'fato superveniente', que simplesmente não trouxe qualquer repercussão concreta ao processo, que não as declarações do ex-ministro Joaquim Barbosa". 

Toron diz considerar "repugnante" a, segundo ele, tentativa de Moro de imputar "má conduta aos advogados, que tenham agido com extrema correção", finalizou. 

Em nota, Cardozo afirmou que "em nenhum momento" recebeu solicitação de advogados para que criasse obstáculos nas investigações ou para atuar em seu favor em relação a medidas judiciais. 

"Caso tivesse recebido qualquer solicitação a respeito, em face da sua imoralidade e manifesta ilegalidade, teria tomado de pronto as medidas apropriadas para punição de tais condutas indevidas", informou a nota. 

Disse ainda que é "dever" do ministro receber advogados no regular exercício da profissão.
A advogada da Odebrecht, Dora Cordani, declarou que não houve "pedido de interferência política" junto a Cardozo. 

"A Odebrecht apenas fez valer seu direito de petição. Ao endossar as críticas de Joaquim Barbosa, o juiz Sérgio Moro volta a confirmar seu desprezo pelo exercício pleno da defesa e pela paridade de armas no processo", disse.
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"Intolerável que emissários dos dirigentes presos e das empreiteiras pretendam discutir decisões judiciais com autoridades políticas"
SÉRGIO MORO Juiz federal
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"É direito dos advogados serem recebidos e eu os receberei. Só na ditadura que isso não se admite" 
JOSÉ EDUARDO CARDOZO Ministro da Justiça, em entrevista à Folha na segunda (16) 

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"Os que recorrem à política para resolver problemas na esfera judicial não buscam a Justiça. Buscam corrompê-la"
JOAQUIM BARBOSA Ex-ministro do STF, na terça (17)
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"[O advogado] tem o direito de ser recebido em audiência, principalmente se a audiência for transparente, pública
 
MARCUS VINÍCIUS COÊLHO Presidente da OAB, quarta (18)
Fotos: Ricardo Borges - 4.dez.2014, Luciano Amarante - 15.nov.2014, Sérgio Lima - 16.jun.2014 e Danilo Verpa - 25.ago.2014/Folhapress

FOLHA

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